TRAVESSIA PRAINHA-GRAÇAÍNHA-FORNO - 05/10/2019

Foto 1: grupo iniciando a caminhada na Prainha.



Iniciamos a caminhada por volta das 9h, perto da entrada da Companhia Álcalis, em direção a um dos cartões postais de Arraial do Cabo que a maioria das pessoas só vê de passagem, dentro do carro, a caminho da cidade (foto 1).

O dia estava ensolarado, mas com um pouco de névoa e muito, muito vento - o mítico nordeste. Ventava tanto, que as saídas de barco foram proibidas pela Marinha, fato que certamente influenciaria no movimento da Praia do Forno, nosso objetivo final. E não deu outra, como contarei mais à frente.

Alguns minutos depois de caminhar pela calçada e as areias da Prainha e entrávamos na trilha para a Praia da Graçainha (não por acaso o nome de um peixe da família dos carangídeos), na realidade um anfiteatro natural onde se forma uma faixa de areia de aproximadamente 15 metros entre as pedras, o suficiente para pescadores tradicionais a usarem como ponto privilegiado para puxar suas redes. Atividade esta que, a propósito, tivemos o privilégio de assistir (foto 2).

Foto 2: pescadores terminando de puxar a rede, na Praia da Graçainha.


Eram aproximadamente 20 pessoas puxando a rede, na pesca de cerco, que consiste "em cercar um cardume de peixes próximo à praia utilizando barcos pequenos ou mesmo canoas de herança indígena, feitas de um só tronco" (definição disponível, em: http://mapadecultura.rj.gov.br/manchete/arte-que-vem-do-mar). E a sorte deles havia sido grande, pois, nas palavras de um integrante da faina, eram mais de 2 toneladas de bonitos-pintados capturados, peixe da família dos atuns (Scombridae).

A água parecia fervilhar, devido ao frenesi de peixes se debatendo por asfixia. Para algumas pessoas, aquilo era visto como um espetáculo raro e valioso de se presenciar. Já para outras, parecia uma espécie de crueldade. Para estes, expliquei que, por ser aquela uma forma tão legítima e ancestral de ganhar a vida, o Ibama criou ali a primeira Reserva Extrativista Marinha do Brasil, em 1997, após estudos iniciados em 1993.

Tais estudos, confirmaram a importância social, cultural e ecológica dessas práticas artesanais e tradicionais de pesca, que encontram-se ameaçadas por uma série de pressões, como a pesca industrial, a poluição, a destruição de habitats marinhos e as influências negativas do turismo.

Desta forma, a Resex-mar de Arraial do Cabo, vem desde então garantindo não apenas a preservação dessa cultura milenar e a sobrevivência de centenas de pessoas, mas também a conservação dos recursos naturais, pesqueiros e ambientais de uma faixa de 3 milhas náuticas que vai desde a Praia do Pontal, divisa com Cabo Frio, até a Praia da Pernambuca, limite com Araruama.

Para se ter uma ideia da importância dessa unidade de conservação, cerca de 60% da população de Arraial está de alguma forma ligada à pesca.

Esclarecido este ponto e já satisfeitos (ou escandalizados) com a cena, continuamos a caminhada, desta vez subindo até outra trilha - já que aquela onde estávamos, passava a ser tomada por carrapatos, logo após a Graçainha. Obra e graça de animais como cavalos e burros que pastam livres neste local, o qual é protegido por uma unidade de conservação de proteção integral (o Parque Estadual da Costa do Sol) e outra de uso sustentável (a APA do Morro da Cabocla).

Felizmente a prevenção contra essa praga deu certo, pois não pegamos nenhum carrapato (ao contrário deste guia, no reconhecimento da trilha, que ficou infestado).

Ao longo do cênico e colorido caminho, o guia ia repassando informações variadas, como sobre a geografia do lugar, sua formação geológica, história e curiosidades, entre outras.

Por volta das 11 horas, quase na "virada" do morro, paramos em um mirante rochoso para apreciar as paisagens no quadrante norte - que englobavam o litoral de Armação dos Búzios e Cabo Frio, além da Serra do Mar, a Laguna de Araruama e as restingas que formam grande parte da chamada Costa do Sol, formadas há poucos milênios (foto 3). Ali lanchamos e tiramos muitas fotos.

Foto 3: o mirante voltado para o quadrante norte.


Pouco depois, parávamos em outro mirante, desta vez voltado para o lado oposto daquele onde havíamos acabado de estar, acima da Praia do Forno e de frente para a Ilha do Cabo Frio e o Pontal do Atalaia. Uma visão ainda mais magnífica (foto 4)!

Lá contei ao grupo sobre o porquê daquele local ter sido o ponto de reunião de corsários, submarinos nazistas e navios ingleses repressores do tráfico de escravos, algo que também tem a ver com a piscosidade e a temperatura mais amena de suas águas (o que motivou o batismo de Cabo Frio, dado pelos primeiros navegadores). Ou seja, sua configuração como zona de inflexão da costa, o que obrigava navios de outrora a "dobrar" o cabo (ou seja, se aproximar da costa) em rotas sul-norte, assim como a ocorrência da ressurgência, fenômeno onde águas frias da Corrente das Malvinas emergem trazendo nutrientes e amenizando a temperatura atmosférica.

Foto 4: o Mirante da Praia do Forno.


Mas havia muito mais a ser contado, como os achados arqueológicos que registram a história dos modos de vida dos habitantes antes do descobrimento, as lorotas históricas que afirmam que Américo Vespúcio fundou Arraial e causos acontecidos durante a Segunda Guerra Mundial, ali. Tarefa complexa comprimir séculos de acontecimentos em alguns poucos minutos... Mas acho que dei conta.

Continuamos pela cumeeira do morro até encontrar com uma antiga rua de paralelepípedos de um loteamento embargado, hoje felizmente engolida pela mata. A partir daí, começa-se a descida, bem suave, onde em determinado momento o calçamento é substituído por uma trilha bem marcada. Ao meio-dia chegávamos às finas e brancas areias da Praia do Forno, mais cheias de gente que o normal em função da interdição dos passeios de barco (foto 5).

Hora de relaxar e curtir o banho de mar!

Embora houvesse sol, o vento incessante e a temperatura mais amena dificultaram um pouco o mergulho, mesmo estando aquecidos da caminhada. A coragem de cair só veio após algum tempo de lagarteagem embaixo do sol.

Foto 5: a chegada à Praia do Forno.


Eu e uma participante, que havia trazido o equipamento de mergulho, conforme sugeri, pudemos também passear por baixo d'água, observando cardumes, uma tartaruga e o relevo submarino das proximidades do costão norte do Forno. Mas por pouco tempo, pois o frio era grande.

Embora a praia estivesse bem cheia, o canto onde estávamos não estava lotado, o que nos permitiu ficar ali por volta de uma hora e meia.

Assim, retomamos a caminhada em seu último trecho, até a Praia dos Anjos, às 13h30. Como a maré estava cheia e o canto sul - o mais próximo do caminho calçado e dos bares - lotado, foi um complicado caminhar por aí (foto 6). Desvia da onda, contorna banhistas deitados, se esgueira nos exíguos espaços entre barracas, foge de crianças correndo e espalhando água... No entanto, sobrevivemos! Só que ainda faltava o último trecho, o do caminho calçado - igualmente cheio.

Desta forma, íamos subindo à medida em que abriam-se brechas nas intermináveis filas. Quando não dava, parávamos em alguns dos diversos mirantes ao longo do trajeto para contemplar as paisagens, retomar o fôlego e fugir da muvuca.

Foto 6: a muvuca na Praia do Forno vista da trilha.


Chegamos ao final do caminho às 14h15, seguindo direto para o restaurante Saint Tropez, para alimentar o corpo - já que a alma estava satisfeita com os banquetes visuais, informacionais e sensoriais.

Enquanto as participantes iam adiantando seus pedidos, fui buscar o Andarilho (a minivan do Ecoando). No retorno, sincrônico, os pratos já estavam sendo servidos. Lauto e impecável almoço, confirmando a continuidade do serviço de excelência desse restaurante.

Depois de fechada a conta, ainda deu tempo de visitar o Museu Oceanográfico da Marinha. E esticar um pouco mais o passeio, subindo de carro até o Pontal do Atalaia para apreciar o pôr do sol de um lugar pouco conhecido e altamente estratégico (foto 7).

Foto 7: o pôr do sol no Pontal do Atalaia.


Como se não bastasse tanta beleza e exclusividade, ainda conseguimos visualizar uma baleia, há aproximadamente 6 quilômetros ao sul, em vários saltos. Fechamento com chave de ouro para "um dia perfeito" (título dado por uma participante a essa vivência realmente espetacular)!

 Veja o relato desta atividade, em: http://www.trilhasdoecoando.blogspot.com. E, para ver as fotos completas, acesse: https://www.ecoando.eco.br/galeria-de-fotos/.



Até a próxima trilha!

Abraços,

Cássio Garcez
Coordenador

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